Iniciativas no século 19
A aspiração de Sesimbra por um porto de abrigo é antiga. A sua Câmara Municipal, na reunião de 18 de Setembro de 1890, aprovou uma Representação, dirigida ao Rei, em que lhe solicitava que:
se digne mandar proceder aos precisos estudos, e depois às necessárias obras, para que no extremo poente da praia desta vila, se faça um porto de abrigo para embarcações (...) O porto de abrigo é tão necessário e indispensável quanto é certo que, numa costa como a desta vila, nenhum recurso há para o salvamento de vidas e de embarcações – resultando daqui gravíssimas consequências, como é obvio. |
Era nessa altura presidente da Câmara o armador Alípio Loureiro. Não é por isso de estranhar que, no ano seguinte, o engenheiro Adolfo Loureiro – que era seu primo – tenha elaborado uma planta para um porto de abrigo no local apontado pela Câmara (1).
Esta foi a primeira de inúmeras petições que os sesimbrenses fizeram, para que fosse construído um porto de abrigo na sua baía. Uma nova petição, em Abril de 1896, levou o Governo, através duma Portaria de 30 de Abril de 1896, a mandar estudar um pequeno abrigo, projecto que estava pronto em 5 de Agosto do mesmo ano.
É provável que seja este o projecto o que Adolfo Loureiro reproduziu na sua magna obra, Portos Marítimos de Portugal (de 1909).
Ainda segundo Loureiro, "A área abrigada do SE mediria 2.100 m2, e 3.000 a do S., em baixa-mar, área que se elevaria a 10.000 m2 em preia-mar. Calculando-se que em média seriam precisos 35 metros quadrados por barco de pesca para estacionar, aquele pequeno abrigo poderia dar cabida a 60 barcos, refugiados do SE., e a 86 do S., ou a mais 28 em preia-mar."
Apresentado o projecto ao Conselho Superior de Obras Públicas e Minas, em Novembro de 1896, este foi de parecer que o projecto poderia ser aprovado a título de “tentativa e experiência”, parecendo-lhe, porém, que o molhe, pelas suas acanhadas dimensões, não ofereceria garantias de resistência em ocasião de fortes temporais. Assim, entendia o Conselho que deveria modificar-se o projecto, aumentando-se, tanto as dimensões dos blocos da primeira fiada, como os das fiadas superiores, elevando-se a largura do molhe de 2 a 4 metros, e dando-se-lhe maior altura.
Adolfo Loureiro, reconhecendo aquelas considerações eram "sensatas e prudentes", explica que foi por economia de meios que optou por aquela solução. A verdade é que nunca o Governo mandou executar a obra, nem sequer reformular o projecto.
O molhe dos anos 1920
A iniciativa de construção do porto só volta a ter novo impulso no período da Primeira República, e muito pela iniciativa de Joaquim Brandão, dado o seu prestígio junto do Governo. O ministro António Granjo visitou Sesimbra, em Agosto de 1921, a convite das autoridades locais, acompanhado do sr. engenheiro Claro da Rica, que não aprovou o plano do seu colega Adolfo Loureiro, mandando fazer outro. A obra teve então início, mas logo em Novembro desse ano, um vendaval destrói parte do molhe; reforçou-se a estrutura, mas em Janeiro de 1922 o mar provoca novos danos.
Interromperam-se as obras para a realização de novos estudos; em 1923 consolidaram-se as obras já executadas e retomou-se a construção, mas dos 180 metros previstos, só se construíram 70 metros: em 1925, novos temporais quebraram o molhe em cinco partes, e a obra foi abandonada. A partir daí, a pouco e pouco, a malfadada muralha foi sendo destruída pelas vagas.
O porto das décadas de 40 e 50
Entre 1947 e 1949 foi construído um novo molhe, agora num ponto mais extremo da baía, permitindo alargar a área de protecção das embarcações. Mesmo assim, o pano da muralha revelou-se insuficiente para conter as vagas, pelo que teve de ser acrescentada uma cortina de cimento ao longo de todo o molhe.
Só em 1973 é que a lota pode ser transferida da praia para o novo edifício no porto de abrigo. Apesar de representar uma melhoria das condições de higiene em que era feita a transacção do peixe, a mudança representou também a perda de um cartaz turístico inigualável, e até a perca de postos de trabalho: os numerosos pescadores que se ocupavam, com as suas chatas, do transporte do peixe, desde as barcas até à praia, ficaram sem trabalho dum dia para o outro.
Nesse ano de 1973, nas quadras dos Santos Populares, encontravam-se várias referências à mudança da lota:
Sesimbra já não tem lota Oh meu rico S. João Levaram-na lá p'ra doca Pró "Campo de Concentração". | A lota foi p'ra "barraca" E de quem foi o capricho? Do bicho de sete cabeças Ou sete cabeças sem bicho. |
O porto dos anos 80
O novo porto representou uma grande melhoria para as condições em que operava a frota de pesca sesimbrense. No entanto, logo aquando da sua construção, se verificou a sua exiguidade. Aproveitando a melhoria de condições portuárias, mas também das novas tecnologias de navegação (rádio-telefone, sondas electrónicas, rádio-goniometros, sistemas de navegação Loran e Ómega) os barcos passaram a navegar para mais longe, para novos pesqueiros, aumentando a dimensão das embarcações e da frota.
A exigência de um novo porto de pesca intensificou-se após a Revolução de 1974 e, depois de muita discussão em torno do projecto do novo porto, em Dezembro de 1984 foi finalmente adjudicada a sua construção.
Em Outubro de 1987 o novo molhe, com 900 m de comprimento, encontrava-se concluído, seguindo-se mais dois meses para acabamento do revestimento interior. Passar-se-ia então à construção dos equipamentos interiores: cais de acostagem rampas, edifícios. Já se ponderava também a necessidade de um quebra-mar a partir da praia, frente ao Hotel do Mar.
Notas:
(1) Carlos Manito Torres, Gazeta dos Caminhos de Ferro, 1-5-1934
João Augusto Aldeia |